MPT e TRT-15 alertam fiéis de Aparecida para a importância da erradicação do trabalho infantil
Em mensagem, Papa Francisco louva esforços das instituições que combatem a prática no Brasil; “Carta de Aparecida” aponta para a necessidade de união em prol da educação e da proteção integral de crianças e adolescentes
Aparecida (SP) - “Toda criança, independentemente de sua condição econômica, social, da cor da sua pele, do lugar onde vive, precisa ter seu direito inalienável de ter uma infância feliz, sendo preservada contra todo tipo de violência e crueldade”. As palavras de “exortação à justiça” integram a “Carta de Aparecida”, um documento simbólico utilizado na campanha do Ministério Público do Trabalho (MPT) e do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15), em parceria com o Santuário Nacional de Aparecida, pela abolição do trabalho infantil, pelo acesso à educação e pela proteção integral e prioritária de crianças e adolescentes.
A campanha, que está no seu sétimo ano consecutivo, tem como objetivo conscientizar centenas de milhares de fiéis católicos que vêm ao Santuário Nacional em peregrinação pelo Dia de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, comemorado no dia 12 de outubro, junto com o Dia das Crianças. O procurador-geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, fez a leitura pública da Carta na missa das 12 horas, e o vice-presidente judicial do TRT-15, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, na Solenidade de Consagração à Nossa Senhora Aparecida, às 15 horas, com transmissão ao vivo pela Rede Aparecida de Comunicação para todo o Brasil.
“Trata-se de uma oportunidade única de comunicar a um público muito amplo da importância do combate ao trabalho infantil, da valorização da infância e da educação e de como cada um pode contribuir para mudar a realidade do nosso país. O mais recente levantamento estatístico oficial demonstrou que ainda há, no Brasil, cerca de 1,7 milhão de crianças e adolescentes em condições de trabalho, sendo que a maioria delas encontra-se em situação de extrema vulnerabilidade social. Tenho certeza de que esta ação em conjunto com o Santuário Nacional trará mudança social e conscientização das famílias dentro dos lares, que se tornarão multiplicadoras da mensagem”, afirma o procurador-geral do MPT.
A “Carta de Aparecida” chama atenção para a importância central da educação na formação dos jovens, “como lâmpada acesa brilhando na escuridão”, pois é somente por meio dela que se concretiza a “materialização dos sonhos”: “para construir uma sociedade mais justa e igualitária, é necessário assegurar a todos o direito fundamental de acesso a uma educação básica de qualidade, emancipadora, que propicie desenvolvimento humano pleno”, diz o texto.
O documento reproduz o grave alerta do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) de que há aproximadamente 2 milhões de crianças e jovens de 11 a 19 anos em situação de evasão escolar no Brasil, segundo levantamento de setembro de 2022, reforçando como causas dessa mazela social o trabalho infantil e as dificuldades de aprendizagem. “Inadmissível que, em pleno século XXI, um País que exporta comida para o mundo conviva com milhões de famintos, entre os quais meninas e meninos da mais tenra idade, forçados a abandonar a escola para trabalhar e poder comer”.
A conclusão da Carta, que parte de uma “postura propositiva”, chama os ouvintes à ação pela união de “mulheres e homens de boa vontade” em torno de um objetivo em comum: exigir “oportunidades iguais como política de Estado” e escolas com padrão educacional de excelência para todos. “Vamos garantir proteção integral e absolutamente prioritária para nossas crianças e adolescentes. As ações de agora refletirão no futuro do Brasil”.
Símbolo pela erradicação do trabalho infantil – Durante as missas em que foram feitas as leituras da “Carta de Aparecida”, os fiéis receberam cataventos de sete pontas, compostas de cinco cores, representativas dos cinco continentes, que são um forte símbolo do combate ao trabalho infantil em todo o mundo.
Apoio do Papa Francisco – Por ocasião do Dia das Crianças e da campanha de erradicação do trabalho infantil, o arcebispo metropolitano de Aparecida, Dom Orlando Brandes, recebeu uma mensagem do Papa Francisco, por meio da Nunciatura Apostólica no Brasil, afirmando que o Sumo Pontífice “reza por todas as crianças da querida nação brasileira, louvando todas as iniciativas que têm por objetivo proteger e custodiar essa etapa da vida humana, destacando entre elas os esforços feitos no sentido da erradicação de todas as formas de trabalho infantil”.
“A manifestação do Papa Francisco representa o apoio não apenas de um líder religioso mundial, mas de um Chefe de Estado à causa pela proteção integral das crianças e adolescentes do Brasil, incluindo a garantia do direito à educação e ao brincar, do direito de ser criança, longe do trabalho. Agradecemos as palavras de incentivo do Sumo Pontífice”, pontua o procurador-geral do Trabalho.
Na mensagem enviada pelo Papa Francisco para a 5ª Conferência Mundial que trata da eliminação da exploração da mão de obra de crianças e adolescentes, que aconteceu na África do Sul em maio desse ano, o Sumo Pontífice pediu aos organismos internacionais e nacionais competentes um “compromisso maior” para minar “as causas estruturais da pobreza global e da desigualdade escandalosa que continua a existir entre os membros da família humana”. Para aquelas “muitas mãos pequenas” forçadas a fazer o que nenhuma criança deveria fazer, o Papa frisou que a exploração laboral as priva “da alegria de sua juventude e de sua dignidade dada por Deus”.
Outras ações no Santuário Nacional – Durante as celebrações dos dias da Padroeira do Brasil e das crianças, em 13 e 14 de outubro, a Escola Judicial do TRT-15 realizará no Santuário Nacional o “Seminário de Combate ao Trabalho Infantil”. Em conjunto com magistrados, procuradores, advogados, especialistas, clérigos, médicos e empresários, os participantes debaterão as causas, consequências e soluções para um dos principais problemas estruturais da sociedade brasileira.
"Não tenho dúvidas de que será um encontro histórico, no qual a interação e o diálogo entre público e conceituados especialistas, ativistas e defensores de direitos humanos fará surgir um olhar renovado sobre a erradicação do trabalho infantil", afirma o diretor da Escola Judicial do TRT-15, desembargador João Batista Martins César.
No dia 01 de dezembro será realizado, em parceria com o MPT e o TRT-15, o projeto “Todo Dia é Dia de Brincar”, com o intuito de promover uma tarde de recreação para as crianças atendidas pelos projetos nacionais do Santuário Nacional da cidade de Aparecida. O evento abordará o tema do combate ao trabalho infantil incentivando a prática do brincar, estimulando a criatividade e o desenvolvimento social, emocional e cognitivo de crianças e adolescentes.
Números - Além das estatísticas apresentadas pela mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), que mostram que 1,7 milhão de crianças entre 5 e 17 anos trabalhavam no país em 2018, dados do Ministério da Mulher, da Família e do Direitos Humanos (MMFDH) afirmam que, em 2019, das mais de 159 mil denúncias de violações a direitos humanos recebidas pelo Disque 100, cerca de 86,8 mil tinham como vítimas crianças e adolescentes. Desse total, 4.245 eram de trabalho infantil.
O UNICEF realizou um levantamento de dados sobre a situação de renda e trabalho com 52.744 famílias vulneráveis de diferentes regiões de São Paulo, que receberam doações da organização e seus parceiros. Entre os dados levantados de abril a julho de 2020, o UNICEF identificou a intensificação do trabalho infantil, com aumento de 26% entre as famílias entrevistadas em maio, comparadas às entrevistadas em julho. A mesma instituição fez um estudo em setembro de 2022, que apontou para cerca de 2 milhões de crianças e adolescentes brasileiros em situação de evasão escolar, tendo o trabalho infantil como uma das principais causas.
O trabalho infantil, além de prejudicar a formação da criança e do adolescente, também tem potencial para causar graves acidentes. Uma pesquisa extraída do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), do Ministério da Saúde, mostra que, no período de 2007 a 2019, no estado de São Paulo, 14.498 crianças e adolescentes das faixas etárias de 5 a 17 anos foram vítimas de acidente grave, com o registro de 41 mortes.
Com imagem de Maria Alice Figueira Campos