Sertãozinho F.C. é condenado em R$ 100 mil por descumprir Lei Pelé

Clube do interior de São Paulo terceiriza atividade de formação de atletas e permite a inserção de atletas menores de 14 anos no desporto de rendimento

Por Camila Correia

Ribeirão Preto – Atendendo a pedidos formulados pelo Ministério Público do Trabalho, o juiz do trabalho Tárcio José Vidotti, titular do Juizado Especial da Infância e Adolescência de Ribeirão Preto, condenou o Sertãozinho Futebol Clube, mais conhecido pela torcida como “Touro dos Canaviais”, a pagar  indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 100 mil por ter descumprido várias obrigações previstas na Lei Pelé, legislação que sistematizou os direitos e garantias das crianças e adolescentes que devem ser observados em relação à formação profissional de atletas. Entre as condutas ilegais, o clube terceirizava a atividade de formação dos adolescentes, permitindo que atletas com idade inferior a quatorze anos praticassem desporto de rendimento, sem qualquer proteção, também ignorando a obrigatoriedade da assinatura de contrato formal, em relação aos atletas maiores de 14 anos. A sentença foi proferida na ação civil pública movida pela procuradora Regina Duarte da Silva, do Ministério Público do Trabalho em Ribeirão Preto.

O inquérito foi instaurado após inspeção do MPT na sede do Sertãozinho Futebol Clube e no Clube Mogiana, em Ribeirão Preto. Segundo os depoimentos colhidos, a agremiação inscrevia os meninos junto à Federação Paulista de Futebol, em razão da obrigatoriedade de possuir categorias de base. Contudo, era o Sr. José Pedro Barbosa dos Santos o responsável por treinar os atletas das categorias sub-15 e 17. No Clube Mogiana, os adolescentes, inclusive menores de 14 anos, confirmaram que foram convidados pelo “Sr. Pedrinho” para treinar, não assinaram contrato de formação e nunca viram médico, massagista ou fisioterapeuta durante os treinos. Após audiências, o MPT propôs a assinatura de Termo de Ajuste de Conduta, mas os réus não se dispuseram a adequar voluntariamente suas condutas.

Para a procuradora, não há dúvidas de que os atletas praticavam desporto de rendimento, uma vez que os adolescentes participavam de competições com outros clubes da região. “Além disso, o “Sr. Pedrinho”, realizava uma espécie de ‘peneira’ constante, valendo-se do prestígio do Sertãozinho e, em troca, indicava ao clube os nomes dos atletas de maior potencial, isto é, as ‘promessas de futuros craques’. O objetivo não é proibir a prática de futebol por crianças e adolescentes menores de 14 anos, mas assegurar que essa prática possua finalidade recreativa e educacional. No que diz respeito aos atletas com idade superior a 14 anos, é necessário o cumprimento da Lei Pelé”, lembra.

O juiz titular do JEIA de Ribeirão Preto julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação ajuizada pelo MPT e determinou que o Sertãozinho cumpra 17 obrigações e José Pedro Barbosa Santos deixe de realizar treinamento, com objetivo de formação profissional, de atletas com idade inferior a 14 anos, na forma do art. 7, XXXIII da Constituição Federal e do art. 29 da Lei Pelé. Alguns dos deveres do clube são: não manter nas categorias de base, com objetivo de formação profissional, atletas com idade inferior a 14 anos; abster-se de terceirizar a atividade de formação de atletas da categoria de base; celebrar contrato formal de formação desportiva com os representantes legais dos atletas, ressaltando que só é permitida a contratação de maiores de 14 anos; fornecer meio de transporte necessário para a frequência à escola; manter equipe permanente de profissionais especializados em formação técnico desportiva, incluindo os profissionais da área médica e fisioterapêutica; conservar o prontuário médico para todos os atletas e contratar seguro de vida e acidentes pessoais.

Além disso, a agremiação deve comunicar o Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, no prazo de 30 dias, a instituição de programas de formação desportiva para atletas com idade inferior a 18 anos. E, por fim, submeter o programa de formação à reavaliação periódica, na forma do disposto no art. 90, § 3 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Projeto “Atletas da Copa e das Olimpíadas” - O Brasil sediou e sediará, em curto espaço de tempo, dois eventos esportivos de grande envergadura mundial: Copa do Mundo (2014) e Olimpíadas (2016). Por este motivo, a Coordinfância (Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes) idealizou o Projeto Nacional “Atletas da Copa e das Olimpíadas”. O projeto destina-se a enfrentar a exploração do trabalho de atletas mirins que veem nos esportes, em especial no futebol, um sonho de realização profissional e riqueza, e que, exatamente por isso, podem vir a ser alvos de violação de direitos. “É preciso fomentar o cumprimento das leis que garantem a proteção dos direitos dos jovens que sonham em atuar no glamoroso e restritivo mundo do futebol e, por conta disso, lançam-se, precoce e desprotegidamente, no mundo da formação profissional do desporto de rendimento”, ressalta Silva.

Cabe recurso no TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da 15ª Região.

Processo nº ACP-0010307-76.2014.5.15.0067

Imprimir