Justiça pede apuração de crime contra a saúde pública cometido por dirigentes de frigorífico de Cabreúva (SP) que descumpriu liminar

Decisão havia suspendido atividades da empresa para evitar a transmissão da Covid-19 entre os funcionários; há dezenas de casos confirmados, além de suspeitas de contágio

Campinas – O juiz da Vara do Trabalho de Itu, Levi Rosa Tome, proferiu nessa sexta-feira (19) uma decisão determinando que o Ministério Público Estadual seja oficiado para apurar suposto crime contra a saúde pública cometido pelos dirigentes do Frigorífico Flamboiã, de Cabreúva (SP), por expor centenas de funcionários ao contágio da Covid-19. Segundo relatório da Vigilância Sanitária de Cabreúva, juntado nos autos do processo movido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a empresa descumpriu a liminar proferida essa semana pelo mesmo juízo, determinado a suspensão de suas atividades pelo prazo de 14 dias, sob a acusação de descumprimento das normas sanitárias, o que resultou no contágio de dezenas de empregados por Covid-19.

 Além disso, a decisão aumentou de R$ 10 mil para R$ 100 mil a multa diária pelo descumprimento de cada item da liminar, “sem prejuízo da possibilidade de interdição do estabelecimento”, no caso de novo descumprimento.

Em sua decisão, o magistrado citou os resultados do relatório da VISA municipal, que constatou as mesmas irregularidades apontadas em vistorias anteriores. “O Relatório é claríssimo: nenhuma das determinações judiciais foi cumprida; o local de maior risco de contágio no município é o estabelecimento da empresa reclamada; há flagrante contrariedade às normas sanitárias vigentes. A conduta da empresa, além de demonstrar descaso para com a ordem judicial, parece configurar crime contra a saúde pública, o que deverá ser aferido pelo juízo competente”, escreveu.

Segundo apurado pela VISA, em 10 de junho havia 9 casos confirmados de Covid-19 no frigorífico, de um total de 60 casos suspeitos notificados pelo SUS, sendo que 30 deles foram constatados em trabalhadores que exercem o cargo de “auxiliar de produção”. Na mesma data, a prefeitura de Cabreúva havia notificado 106 casos confirmados de Covid-19 e 51 suspeitos no município. Os trabalhadores do frigorífico representavam, até aquele momento, 38,21% do total de casos na cidade. Contudo, em 12 de junho, o número de funcionários infectados por Covid-19 salto de 9 para 28. Acredita-se que, atualmente, o número de infectados é bem maior.

A liminar proferida nessa terça-feira (16), atendendo aos pedidos do Ministério Público do Trabalho, determinou a suspensão por 14 dias das atividades do frigorífico Flamboiã e determinou que a empresa faça o teste de Covid-19 em todos os funcionários da planta industrial, liberando o retorno de cada trabalhador somente após o diagnóstico negativo. A decisão é válida para empregados efetivos e terceirizados.

A liminar ainda determinou que, no período de suspensão de atividades, o contrato de trabalho dos empregados deve ser interrompido, sem prejuízo na remuneração, ficando autorizado o uso de “interrupção contratual válida”, como férias coletivas, licença remunerada, etc. O frigorífico deve fornecer equipamentos de proteção e insumos de higiene, como máscaras e álcool em gel, acolher atestados médicos de afastamento por suspeita de Covid-19 ou por contato com pessoas que contraíram a doença. Nesse período, o Flamboiã pode operar apenas com poucos empregados, para possibilitar a conservação de máquinas e de alimentos, e ainda deve apresentar, ao término da suspensão das atividades, um “plano de contingenciamento e/ou prevenção de infecções e transmissibilidade”, com acompanhamento da Vigilância Sanitária de Cabreúva e do MPT.

A procuradora Danielle Olivares Corrêa ingressou com ação civil pública após investigar o frigorífico a partir de denúncia da VISA de Cabreúva, que relatava alto grau de transmissão da Covid-19 entre trabalhadores de dentro da planta fabril. O MPT recebeu relatórios de duas inspeções realizadas pela VISA, informando uma série de irregularidades que afrontam a normativa sanitária relativa à prevenção do contágio do coronavírus. Locais sem ventilação, aglomeração de funcionários (trabalho ombro a ombro), falta de orientações sobre higienização, não aferição de temperatura, funcionários sem máscara, ambulatório médico sem licença sanitária, acúmulo de pessoas nos sanitários, transporte de trabalhadores em fiscalização e limpeza regulares, insuficiência de insumos para limpeza das mãos, falta de plano de contingência para evitar a transmissão do coronavírus e até funcionários com sintomas gripais trabalhando. Essas foram algumas das constatações no relatório de inspeção da VISA de Cabreúva.

Durante o inquérito, o frigorífico não atendeu às exigências da VISA, apresentando plano de contingência insuficiente para atender às normas sanitárias, que possibilitassem efetiva proteção dos trabalhadores. Em razão da urgência das medidas a serem tomadas, o MPT ajuizou a ação.

Processo nº 0011048-59.2020.5.15.0018

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