Indenização encerra processo envolvendo trabalhadores adolescentes em situação degradante em colheita de Pedregulho (SP)

Montante de cerca de R$ 250 mil será direcionado para programas educacionais na cidade de Aracatu (BA), local de origem dos jovens trabalhadores

Ribeirão Preto - O Ministério Público do Trabalho (MPT) celebrou acordo judicial com empregadores rurais perante a 2ª Vara do Trabalho de Franca, pelo qual os réus pagarão o valor equivalente à venda de 250 sacas de café (cerca de R$ 250 mil), a título de danos morais coletivos, por submeterem adolescentes de 13 a 17 anos a condições análogas à escravidão. A verba será revertida para projetos educacionais na cidade de Aracatu, de onde os jovens foram trazidos para a colheita de café na cidade de Pedregulho (SP). O processo encontra-se em segredo de justiça.

A audiência, em regime de cooperação judicial, realizada por teleconferência, reuniu o procurador Élisson Miessa, a juíza titular e coordenadora do Juizado Especial da Infância e Adolescência (JEIA) de Franca, Eliana dos Santos Alves Nogueira e, em razão da cidade de origem dos trabalhadores, dois magistrados do TRT-5 (BA): a juíza Cristiane Menezes Borges Lima, titular da VT de Brumado, e o juiz Joalvo Carvalho de Magalhães Filho, gestor do Programa Regional de Combate ao Trabalho Escravo do TRT-5. Participaram da audiência os desembargadores Eduardo Benedito de Oliveira Zanella e João Batista Martins Cesar, que presidem, respectivamente, os Comitês para a Erradicação do Trabalho Escravo Contemporâneo, do Tráfico de Pessoas, da Discriminação de Gênero, Raça, Etnia e Promoção de Igualdade, e de Erradicação ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, ambos do TRT da 15ª Região. 

Em junho de 2021, uma operação realizada pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), que teve o acompanhamento do MPT e da Polícia Federal, resultou no resgate de 56 trabalhadores de condições análogas à escravidão em uma fazenda de colheita de café na cidade de Pedregulho (SP). Dez deles eram adolescentes entre 13 e 17 anos de idade.

Os colhedores de café trabalhavam informalmente, sem registro em carteira de trabalho. Eles pagaram do próprio bolso a passagem de vinda de Aracatu ao interior de São Paulo, inclusive as pessoas menores de 18 anos, que estavam acompanhadas de seus pais, também colhedores de café. O combinado, segundo depoimentos, era de que eles também se responsabilizariam pela aquisição das passagens de retorno ao local de origem no final da colheita. Eles chegaram em Pedregulho no final de abril, mas até o momento da operação não haviam recebido salário, mas esperavam por recebê-lo uma vez concluída a colheita; os depoimentos evidenciam que os trabalhadores não sabiam sequer o quanto iriam receber.

As autoridades identificaram jornada de trabalho excessiva (com casos que vão das 6h às 17h), em esquema de trabalho por produção, e ainda irregularidades no cômputo do café colhido, para fins de pagamento.

Alojamentos - Os alojamentos onde os trabalhadores moravam foram cedidos pelos empregadores, sem cobrança de aluguel, e ficavam distantes 20 km das frentes de colheita. Para fazer o traslado casa-trabalho-casa, o empregador dispunha de um ônibus precário, sem condições de tráfego, sendo que o condutor não possuía sequer carteira de habilitação.

Os casebres apresentavam condições insalubres e desumanas. Em quatro pequenas unidades vivam mais de 60 pessoas em condições precárias (inclusive crianças). Devido ao número insuficiente de camas, mais de uma pessoa ocupava os colchões de solteiro, e mais de duas os colchões de casal. Homens solteiros ficavam sob o mesmo teto das famílias.

A falta de vedação de portas e janelas propiciava a entrada de intempéries, especialmente o frio, além de não haver forros e os vidros estavam quebrados. Não havia armários, lavanderia ou banheiros em número suficiente para todos, o que comprometia a higiene dos locais. As instalações elétricas eram precárias. Dentro de cada unidade havia um botijão de gás, o que é proibido pela norma, haja vista o risco de explosão e asfixia, em caso de vazamento.

Os agrotóxicos ficavam ao lado das áreas de vivência dos alojamentos. As embalagens vazias destes agrotóxicos eram reaproveitadas pelos moradores para a lavagem de roupas.

Frentes - As frentes de trabalho não dispunham de banheiros e refeitório, exigidos pelo Norma Regulamentadora nº 31. Aos trabalhadores não eram fornecidos equipamentos de proteção individual (máscaras, óculos, chapéus, botas e luvas), e tampouco máscaras e álcool em gel, expondo-os ao risco de contágio da covid-19.

Providências – Os fiscais do GEFM lavraram auto de resgate por trabalho análogo à escravidão, o que concedeu aos trabalhadores o direto ao seguro-desemprego.

O MPT firmou Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com os empregadores, garantindo o pagamento das verbas rescisórias, além de indenizações por danos morais individuais (que variaram de R$ 4 mil a R$ 6 mil para cada trabalhador) e uma indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 50 mil, totalizando mais de R$ 500 mil em verba indenizatória e rescisória. No TAC, os signatários assumiram cerca de 24 obrigações trabalhistas relacionadas ao meio ambiente do trabalho rural, pagamentos salariais, formalização de contrato, alojamentos, entre outras. O retorno dos trabalhadores para a Bahia foi custeado também pelos empregadores.

Além do acordo extrajudicial foi firmado um acordo judicial na ação civil pública para tutelar os direitos dos adolescentes encontrados em situação degradante, que resultou na indenização coletiva de cerca de R$ 250 mil, que propiciará um investimento na formação de jovens e adolescentes que residem na cidade de origem dos trabalhadores resgatados, sob responsabilidade do TRT-5.

“O objetivo do processo foi alcançado como um todo, a partir das obrigações de fazer assumidas pelos empregadores, bem como as indenizações para cada um dos trabalhadores, sob o aspecto do dano moral individual. O dano moral coletivo também foi contemplado de forma mais ampla e, agora, uma indenização direcionada a crianças e adolescentes, como forma de tutelar esses trabalhadores e criar um projeto na sua cidade de origem, para que não se submetam novamente a atividades degradantes e possam ter o aprendizado de uma atividade, para que sejam inseridos de forma adequada no mercado de trabalho”, finalizou o procurador Élisson Miessa.

Com informações da ASCOM do TRT-15

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