CDHU e construtora Viasol são condenadas por casos de trabalho escravo no interior de São Paulo

Ação civil pública do MPT foi ajuizada após resgates em canteiros de obras de casas populares em Aguaí, Jaguariúna e Rafard; empresas pagarão indenizações por danos morais coletivos

Campinas - O juízo da 6ª Vara do Trabalho de Campinas (SP) condenou a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU) e a Construtora Viasol Ltda. ao cumprimento de uma série de obrigações trabalhistas em empreendimentos conduzidos por elas, com especial atenção às condições de saúde e segurança, de alojamentos de trabalhadores e ao pagamento de salários e verbas rescisórias. Ambas as rés devem pagar indenizações a título de danos morais coletivos, nos valores de R$ 200.000,00 e R$ 1.000.000,00, respectivamente. Em 2019 foram efetuados resgates de trabalhadores em condições análogas à escravidão em três canteiros de obra sob responsabilidade das rés, nas cidades de Aguaí, Jaguariúna e Rafard.

A sentença do juiz Rafael Marques de Setta, proferida no dia 2 de setembro de 2021, confirmou as obrigações impostas em liminar proferida em março de 2021, determinando as seguintes obrigações à Construtora Viasol: não manter trabalhadores sob condições contrárias à lei, em especial a submissão ao regime forçado de trabalho, garantindo ambiente de segurança, higiene e salubridade; manter alojamentos em condições salubres, conforme a Norma Regulamentadora nº 18, que rege o setor de construção civil; fazer a prevenção de incêndios; fornecer uniformes e equipamentos de proteção individual; exigir exames médicos; conceder descanso semanal remunerado; pagar salários, FGTS e 13º salário em dia e de forma integral, bem como garantir o pagamento das verbas em rescisões de contrato, sob pena de multa de R$ 10.000,00 por infração e por trabalhador prejudicado. Pelos danos morais coletivos, a Viasol deve pagar indenização no valor de R$ 1.000.000,00.

A CDHU, por sua vez, deve fiscalizar o cumprimento da lei trabalhista em suas prestadoras de serviços, de forma que nenhum trabalhador seja submetido a condições contrárias às disposições da proteção do trabalho, ou seja submetido a condições de trabalho forçado. A pena pelo descumprimento será de multa de R$ 10.000,00 mil por infração. A CDHU deve pagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 200.000,00.

Cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15).

Histórico - Entre os meses de agosto e setembro de 2019, foram flagrados trabalhadores migrantes em condições análogas à escravidão em três municípios do interior paulista, por meio de operações conduzidas pelo MPT e pelo Grupo de Combate ao Trabalho Escravo da Superintendência Regional do Trabalho de São Paulo (SRT-SP). A procuradora Marcela Dória conduziu as investigações, sendo responsável também, pelo ajuizamento da ação civil pública.

Jaguariúna - Em Jaguariúna, a SRT-SP resgatou nove operários que permaneciam alojados em condições precárias, sem receber salários por 3 meses. Os auditores fiscais do trabalho constataram que os trabalhadores eram empregados da Viasol, contratada pela CDHU para a execução de diversas obras habitacionais no estado de São Paulo. Na ação fiscal, a CDHU e a Viasol foram responsabilizadas pelas condições a que os trabalhadores foram submetidos.

A maioria dos migrantes foi recrutada pela Viasol no Maranhão. A empresa os mantinha alojados em condições precárias de segurança e higiene em uma obra abandonada pertencente à empresa, sem proteção contra intempéries e sem contar com energia elétrica, água potável e alimentação em quantidade suficiente. Além disso, os trabalhadores estavam há três meses sem receber salários e sem possibilidade de retornar às suas cidades de origem.

Com base na auditoria dos contratos firmados entre as empresas, os fiscais atribuíram responsabilidade também à CDHU pela situação de precariedade enfrentada pelos trabalhadores. Houve ainda o descumprimento, por parte da empresa pública, da Convenção OIT nº 94, que trata de contratos realizados por órgãos públicos.

Em Aguaí e Rafard, nove trabalhadores foram abandonados pela Viasol, nas obras de construção de casas populares da CDHU nos dois municípios. A empresa desapareceu e deixou os trabalhadores, todos migrantes da região Nordeste, sem salários e sem moradia.

Aguaí - Em Aguaí, três operários foram deixados em uma moradia com aluguel vencido, a ponto de serem despejados. Sem dinheiro para sobreviver, e tampouco para voltar para a casa, os trabalhadores denunciaram a situação ao MPT. A procuradora Marcela Dória foi até o local na época (agosto de 2019) e se reuniu com representantes da CDHU, contratante direta da Viasol para execução do empreendimento em Aguaí.

A empresa pública firmou termo de ajuste de conduta (TAC), se comprometendo a realizar o pagamento da quantia equivalente a 3 salários do piso da categoria de cada um dos empregados, diretamente na conta bancária deles.

Rafard - Em Rafard, seis trabalhadores também foram abandonados pela construtora Viasol, e tiveram que se alojar nas casas do conjunto habitacional que estavam construindo, ficando inclusive sem alimentação. O MPT se reuniu em Piracicaba com representantes da CDHU, da prefeitura de Rafard, do sindicato da categoria e com 2 trabalhadores para solucionar a questão.

O Município de Rafard, contratante direto da Viasol, firmou TAC se comprometendo a pagar salários atrasados e verbas rescisórias dos 6 trabalhadores, além de oferecer uma ajuda de custo de R$ 400 para que eles voltassem para suas casas no Maranhão, seu estado de origem. Na audiência, a CDHU informou que envidaria esforços para pagar o quanto antes o crédito ainda devido ao Município, que seria usado para cumprir as obrigações do TAC.

 

Processo nº 0010245-11.2021.5.15.0093

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