MPT dá prazo de 90 dias para regularização trabalhista de olarias da região de Piracicaba

Notificação recomendatória foi entregue em audiência pública na Câmara de Piracicaba; meio ambiente do trabalho e trabalho infantil estão entre as prioridades de adequação

Piracicaba - O Ministério Público do Trabalho realizou nessa quinta-feira (26), no auditório da Câmara Municipal de Piracicaba, uma audiência pública com empresas do segmento de olarias da região de Piracicaba, com a participação do Cerest (Centro de Referência e Saúde do Trabalhador), do Ministério do Trabalho e Emprego, do Instituto Formar e do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil. Na oportunidade foram entregues aos representantes das empresas – 26 no total - notificações recomendatórias indicando o cumprimento da legislação trabalhista, com ênfase nas normas de proteção à saúde e segurança do trabalho e trabalho infantil.

O encontro foi provocado pelos recorrentes problemas encontrados nas empresas do segmento, especialmente nos municípios de Saltinho, Charqueada e São Pedro, considerados polos de produção de tijolos e cerâmica. Dentre as principais irregularidades observadas pelos órgãos de fiscalização estão a falta de proteção em máquinas, de equipamentos de proteção individuais e coletivos, de áreas de vivências (com destaque para refeitórios), de medidas de organização e limpeza das áreas de circulação de pessoas, além de precariedade nas instalações elétricas e a ocorrência de trabalho de crianças e adolescentes.

A notificação entregue pelo Ministério Público contém 23 itens relacionados à legislação de segurança e saúde do trabalho a serem cumpridos no prazo de 90 dias, seguidos de outras recomendações acerca da lei que regulamenta o trabalho de menores de 18 anos, formalização de contrato de trabalho, remuneração, jornada de trabalho e contribuição sindical, dentre outras. “Após a entrega da notificação, não há mais como dar desculpas e não regularizar a situação trabalhista. A partir de agora não haverá mais diálogo. A empresa que for encontrada descumprindo a lei será multada e poderá responder a inquérito no Ministério Público”, alertou o técnico do Cerest Marcos Hister.

O MPT instaurou no ano passado um procedimento promocional (Promo) para analisar a situação trabalhista do segmento das olarias daquela região, a partir de um projeto empreendido pelo Cerest de Piracicaba desde 2007, que surgiu da visita de uma equipe multidisciplinar para estabelecimento de nexo causal em uma fábrica de tijolos.  “A maioria das empresas que compõem os setores de olarias e cerâmicas vermelhas de Piracicaba e região possui pouco conhecimento sobre cultura de segurança do trabalho. Essas situações podem estar relacionadas ao fato das empresas serem predominantemente familiares, de pequeno porte, tecnologias rudimentares e localizadas na zona rural”, afirma Hister.

A necessidade de desenvolver ações mais abrangentes para o segmento levou o Cerest a criar um projeto de políticas públicas por meio de ações interinstitucionais. Daí em diante diversas medidas foram tomadas, como a realização de fóruns e seminários, a elaboração de cartilhas específicas, implementação de projetos educativos e de ações de fiscalização, e até a constituição da Associação das Olarias e Cerâmicas Vermelhas, no sentido de organizar o segmento.  “Toda a mobilização para reverter o processo de fechamento das olarias e cerâmicas vermelhas possibilitou a mudança de comportamento de alguns empresários, mas ainda há muitos problemas a serem enfrentados”, esclarece Hister.

A audiência pública teve início com a explanação da procuradora Lorena Vasconcelos Porto acerca da atuação do Ministério Público, suas atribuições e as formas de intervenção, sejam preventivas ou repressivas, em defesa dos direitos coletivos e difusos dos trabalhadores. Lorena levantou os principais aspectos do Promo iniciado em face das olarias da região de Piracicaba, explicando ao empresariado sobre as duas principais frentes de atuação: a regularização do meio ambiente do trabalho a erradicação do trabalho infantil na fabricação de tijolos e cerâmicas.

Trabalho infantil –o gerente regional do trabalho e emprego de Piracicaba, Antenor Varola, um dos expositores na audiência pública, deu enfoque na sua apresentação ao diálogo em prol da erradicação do trabalho infantil. Falando a um público que, culturalmente, ainda vê com certa normalidade a contratação de menores de 18 anos para o trabalho na fabricação de tijolos, Varola alertou para os riscos que o trabalho traz à saúde física, social e psicológica de crianças e adolescentes. Não por menos, o trabalho em olarias e cerâmicas consta do decreto federal nº 6.481 como sendo uma das piores formas de trabalho infantil.

O gerente utilizou-se de uma fundamentação técnica e científica para mostrar aos presentes os perigos de expor jovens, com estrutura corpórea ainda em formação, a trabalhos pesados, em ambientes com muita poeira, desencadeadora de doenças pulmonares como a silicose. “Respeitar o período de formação do jovem, sem que ele seja exposto ao trabalho, é fundamental para que ele atinja, na idade adulta, condições psicofisiológicas adequadas para exercer sua vida pessoal e profissional”, afirma Varola.   

Para reforçar a ideia do Ministério do Trabalho e Emprego, o gerente administrativo do Instituto Formar de Aprendizagem e membro da Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Infantil de Piracicaba, Fábio do Amaral Sanches, falou sobre a importância do trabalho interinstitucional na implementação de políticas públicas de erradicação, e como isso já está afetando o setor de olarias. Ele explicou sobre o ciclo que se inicia no mapeamento de informações, por meio de entidades como o Cerest e Conselho Tutelar, até chegar à ponta da cadeia, responsável pela adequação da conduta das empresas, citando o próprio Ministério Público do Trabalho como agente de transformação. Contudo, lamentou que o processo não tenha a rapidez necessária. “Justamente esta audiência, junto com a mobilização da sociedade, pode ser uma ferramenta para que o processo seja mais rápido. O fluxo de informações deve ser um organismo vivo”, espera Sanchez.

 

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil e Mobiliário de Piracicaba, Milton Costa, que participou ativamente das visitas empreendidas pelo projeto inicial do Cerest, foi enfático ao falar da efetividade gerada pelo trabalho conjunto das instituições no combate às irregularidades trabalhistas no segmento. “Reunir todos os agentes envolvidos no processo é o que contribui para reverter a situação atual”, afirma.   

 

 

Ao final de debates com a participação ativa de empresas e Associação das Olarias, a procuradora do MPT manifestou sua expectativa em torno do cumprimento das recomendações. “Esperamos que no prazo de 90 dias as olarias cumpram as recomendações que constam da notificação. Ao final desse período será feita uma fiscalização geral das empresas do segmento, oportunidade pela qual será possível verificar o nível de regularização de cada uma delas”, finaliza Lorena Vasconcelos Porto. 

 

 

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