MPT investiga condições de trabalho nos frigoríficos do interior de São Paulo

Força-tarefa inspecionou doze frigoríficos do interior de São Paulo e constatou problemas de segurança no monitoramento dos riscos da amônia e excesso de afastamentos por lesão

 

Por Camila Correia

Campinas – O Ministério Público do Trabalho encerrou essa semana uma força-tarefa que inspecionou 12 frigoríficos no interior de São Paulo ao longo do ano de 2014, todos localizados em cidades nas regiões de Campinas, Jundiaí e Piracicaba. A operação, que atingiu um total de cinco mil trabalhadores, teve como objetivo fazer um diagnóstico dos principais problemas do setor e, por meio dele, buscar elementos para a prevenção de acidentes e doenças ocupacionais, assim como a regularização de outras questões trabalhistas. As principais irregularidades constatadas foram o excesso de movimentos repetitivos executados pelos trabalhadores (decorrente da falta de ergonomia nos postos de trabalho), a ausência de cuidados na prevenção de acidentes relacionados ao uso de amônia e outros problemas que podem comprometer a saúde e segurança do trabalhador.

A força-tarefa decorre de um Promo (procedimento promocional) instaurado pela procuradora Carolina Marzola Hirata Zedes no primeiro semestre desse ano, em cumprimento a um programa nacional implementado pela Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho (Codemat). O Promo é uma ferramenta utilizada pelo Ministério Público para investigar de forma ampla e difusa um segmento da economia, no caso, as empresas de processamento de carne.

No período que decorre de fevereiro a dezembro de 2014 foram inspecionadas unidades das seguintes empresas: Adoro S/A (Várzea Paulista), Rigor Alimentos Ltda. (Jarinu), Frigorífico Angelelli Ltda. (Piracicaba), Korin Agropecuária Ltda. (Ipeuna), Cooperativa de Produção Agropecuária de Itatiba (Louveira), Produtos Alimentícios Marchiori Ltda. EPP (Amparo), Frigodeliss Cames (Capivari), Frihelp Frigorífico Vale das Águas Ltda. (Socorro), Agrivert Indústria e Comércio Ltda. EPP (Valinhos), Cooperativa de Trabalho de Profissionais (Louveira), Frigoestrela S.A. (Estrela d’Oeste) e JBS S/A (Amparo). Parte das inspeções foi realizada em parceria com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Cerest (Centros de Referência em Saúde do Trabalhador) de Piracicaba.

A força-tarefa teve como norte o cumprimento da Norma Regulamentadora nº 36, publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, responsável pela regulamentação do trabalho em frigoríficos. Ela estabelece regras para garantir a saúde e a segurança de trabalhadores que se ativam no setor.

Os principais itens que foram avaliados estão relacionados ao oferecimento de assentos ergonômicos nos postos de trabalho, à instalação de dispositivos de segurança que possibilitem a abertura das portas pelo interior de câmaras frias e alertem se há trabalhadores presos no interior das câmaras (alarmes), à proteção de máquinas, às medidas de segurança para o uso da amônia, à inclusão na jornada de trabalho do tempo de troca de uniforme e deslocamento até o local de trabalho, à vedação de horas extras e ao fornecimento de  equipamentos de proteção individual. 

Amônia - O despreparo dos frigoríficos em estabelecer programas de segurança para prevenir a exposição à amônia foi uma das irregularidades mais notadas no decorrer da força-tarefa. Segundo a procuradora Carolina Marzola Hirata Zedes, a maioria das unidades visitadas estava operando sem o monitoramento das concentrações ambientais de amônia e não possuíam mecanismos para a detecção precoce de vazamentos, painel de controle do sistema de refrigeração, chuveiros de segurança, kits para reparo de vazamentos, procedimentos para evacuação e lava-olhos. Fontes científicas especializadas mostram que a amônia é um gás extremamente tóxico, altamente corrosivo, pois destrói tecidos da área respiratória e pode levar à morte quem o inala. O contato com a pele pode causar queimaduras graves e irritação severa e, nos olhos, pode causar cegueira. 

A procuradora ressalta, inclusive, que o MPT já atuou em casos de vazamento da substância que resultaram em acidentes gravíssimos, com trágicas repercussões à saúde dos trabalhadores envolvidos. “É inaceitável que as principais empresas de processamento de proteína animal do interior de São Paulo não mantenham os padrões mais elementares de segurança para geração de frio e vapor. Quase que 100% dessas instituições não seguem as regras. Algumas delas até ajudaram a estabelecer as normas e tiveram participação ativa nas discussões para a elaboração da NR-36, a norma regulatória do setor. O meu papel aqui está sendo alertar e exigir a adequação das irregularidades encontradas”, afirma.

Doenças ocupacionais – Um dos itens que chamou atenção do MPT foi o alto nível de adoecimento por questões ocupacionais, tendo flagrado casos em que o número de trabalhadores doentes, em geral por LER/Dort, atingiu quase 30% do total de  afastamentos. Ao abordar a matéria, o MPT se apoiou no NTEP (Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário), um importante mecanismo auxiliar para a caracterização de um acidente ou doença do trabalho, cuja indicação está embasada em estudos científicos alinhados com os fundamentos da estatística e epidemiologia. A partir do cruzamento das informações de código do CID (Classificação Internacional de Doenças), o NTEP aponta a existência de relação entre a lesão e a atividade desenvolvida pelo trabalhador. As planilhas de atestados médicos de 2013 apresentadas pelos frigoríficos revelaram um número assustador de atestados médicos em sequência, consignando a relação CID-NTEP com a atividade principal da empresa. A média de adoecimento atingiu 25% dos atestados médicos, em especial devido à submissão a atividades repetitivas.

Próximos passos - Encerrada a fase de diagnósticos, a atuação do MPT terá continuidade na busca pela regularização das relações de trabalho no setor. “Será dado seguimento ao que já foi iniciado nessa força-tarefa. O Promo, felizmente executado com cada vez mais frequência pelo MPT, tem o objetivo de realizar ações preventivas que promovam a adequação das empresas às normas trabalhistas. É exatamente isso que nós buscamos durante todo esse ano nas empresas de abate e processamento de carnes”, explica a procuradora.  

Com o setor devidamente mapeado, cada frigorífico inspecionado pelo Ministério Público será investigado individualmente por um procurador, que tomará as providências necessárias para o enquadramento da empresa na NR-36. 

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