Audiência coletiva alerta para o cumprimento da cota de aprendizagem em Americana

Iniciativa do MPT e da Prefeitura de Americana busca suprir os gargalos relativos à contratação de jovens aprendizes na cidade

Campinas - O Ministério Público do Trabalho (MPT), em conjunto com a Secretaria de Ação Social e Desenvolvimento Humano da Prefeitura de Americana, realizou na manhã dessa sexta-feira (9) uma audiência coletiva com representantes de 119 empresas da cidade para debater sobre a obrigatoriedade da contratação de jovens aprendizes segundo a lei de cotas (nº 10.097/00). O evento contou com o inestimável apoio do Juizado Especial da Infância e Adolescência (JEIA) de Campinas, e teve a presença de entidades formadoras, vereadores e imprensa.

O procurador e representante regional da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes (Coordinfância), Paulo Crestana, foi o primeiro a fazer uma exposição aos presentes. Ele explicou sobre as funções institucionais do Ministério Público do Trabalho e as suas formas de atuação. “A opção é sempre pela atuação preventiva, conscientizando os empregadores das suas obrigações e tendo a concordância pelo ajuste voluntário da conduta em caso de descumprimento da lei. Mas se não houver essa contrapartida, o MPT e as instituições de defesa do trabalho podem atuar de forma repressiva. Em alguns casos, se necessário, abre-se a porta do judiciário”, explicou.

Crestana abordou os conceitos de trabalho infantil, diferenciando o trabalho como aprendiz, que ocorre de forma protegida, do trabalho irregular, conforme previsão do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), da Constituição Federal, da CLT e do Decreto 6.481, que lista as piores formas de trabalho infantil.

 

 

Em seguida, explicou os requisitos da aprendizagem. “Não basta colocar um crachá no trabalhador jovem e dizer que ele será um aprendiz. É necessário matriculá-lo em curso de formação, a ser beneficiado pelo sistema S ou entidade sem fins lucrativos, ter contrato escrito, entre outras obrigatoriedades. A aprendizagem é uma importante forma de combater o trabalho infantil e os problemas decorrentes da prática, como a evasão escolar, problemas de natureza física, psíquica, moral e social”, citou. O último Censo Demográfico do IBGE apontou que, em Americana, havia 3,3 mil crianças e adolescentes entre 10 e 17 anos ocupados. No período de 2012 a 2018, também na cidade de Americana, foram notificados 197 acidentes de trabalho envolvendo adolescentes, conforme o Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho – AEAT e o banco de dados de Comunicações de Acidentes de Trabalho.

Aprendizagem - A Lei da Aprendizagem determina que todas as empresas de médio e grande porte contratem adolescentes e jovens entre 14 e 24 anos no importe de 5% a 15% do total de seus empregados cujas funções demandem formação profissional, segundo a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). Para ser considerado aprendiz, o jovem deve ter concluído ou estar cursando o ensino fundamental e deve ter vínculo com organização que ofereça Programa de Aprendizagem. Ao longo de sua experiência de aprendizagem, ele deve ter jornada compatível com os estudos, receber ao menos um salário mínimo/hora, ter registro em carteira de trabalho e ser acompanhado por um supervisor da área.  

O procurador explicou com detalhes a obrigatoriedade da contratação via sistema de cotas, como os representantes das empresas fazem o cálculo para contratação e o sistema de cotas sociais, voltado a empresas que tenham dificuldades na colocação de aprendizes, por exemplo, em decorrência de sua atividade econômica. Neste caso, a empresa custeia, mas a aprendizagem se desenvolve em ambientes de terceiros, inclusive em instituições públicas. “O cumprimento da cota alternativa também possibilita a contratação de adolescentes egressos do sistema socioeducativo ou em cumprimento de medidas socioeducativas, o que dá um caráter social ao programa. É uma oportunidade das empresas contribuírem com a sociedade”, afirmou.

Segundo dados do Observatório de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, mantido pelo Ministério Público do Trabalho e pela Organização Internacional do Trabalho, no ano de 2017 (mais recente medição) existiam 604 jovens aprendizes contratados pelas empresas da cidade de Americana. Contudo, de acordo com informações da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia, com base nos sistemas RAIS e CAGED (medidos até fevereiro de 2019), há um potencial no município de 1,7 mil cotas para a contratação de aprendizes. “Vemos uma evolução no número de contratações de 2012 a 2017 na cidade de Americana, mas está muito aquém do potencial da cidade para empregar jovens aprendizes. Com a ajuda da Secretaria de Ação Social e Desenvolvimento Humano, vamos consolidar o material encaminhado pelas empresas e fazer um acompanhamento da situação no município para mudar essa realidade”, finalizou.

A juíza responsável pelo JEIA Campinas, Camila Ceroni Scarabelli, mostrou aos presentes o conceito do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, que tem como objetivo desenvolver ações em prol da erradicação do trabalho infantil e de adequada profissionalização do adolescente, passando pelas atribuições do JEIA, que possui jurisdição em 79 municípios do interior paulista.

 

 

Em seguida, a juíza expôs dados que evidenciam a existência de mão de obra disponível no município para contratação em programas de aprendizagem. “Já fiz audiências com empresas que disseram que não havia jovens disponíveis para contratação na sua cidade. Em Americana existem mais de 12 mil jovens de 14 a 17 anos, ou seja, não há como usar essa justificativa”, disse. Ela alertou que, caso a empresa seja acionada no judiciário, não haverá alternativa senão proceder ao devido cumprimento da lei, de forma que todos aproveitem a oportunidade para cumprir voluntariamente a lei de cotas.

Para Camila, na aprendizagem todos ganham: os adolescentes, as empresas e a sociedade, na medida em que se forma mão de obra especializada, confere oportunidades de empregabilidade no futuro e combate o trabalho infantil, entre outros. “Os benefícios que o programa traz para os jovens são a proteção de direitos, a regularização de questões trabalhistas e de contratação e a saída do mercado informal. Quando o jovem atua em programa dentro da faixa etária permitida, a empresa obtém ganhos também, participando da formação e da profissionalização de um ser humano para exercer uma atividade e um cargo dentro das necessidades que a empresa tem, além de cumprir a lei”, afirmou.

Quatro empresas formadoras de jovens aprendizes tiveram a oportunidade de expor o trabalho realizado por suas instituições, e a plateia participou de debates. As empresas terão que comprovar o cumprimento da cota de aprendizagem mediante entrega de documentação, solicitada pelo MPT, à Secretaria de Ação Social e Desenvolvimento Humano. Aquelas empresas que não cumprirem a lei serão investigadas pelo Ministério Público e poderão ser processadas na Justiça do Trabalho.

 

 

 

 

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