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Audiência pública alerta a sociedade dos riscos da venda da Embraer para o futuro do Brasil

São José dos Campos - O Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos realizaram na última segunda-feira (20) uma audiência pública no plenário da Câmara Municipal de São José dos Campos para debater sobre os riscos à manutenção dos empregos na planta da Embraer após a compra de 80% da divisão de aviação comercial desta empresa pela norte-americana Boeing.

Os procuradores Rafael de Araújo Gomes, de Araraquara, e Ana Farias Hirano, de São José dos Campos, representaram o MPT na audiência, que também contou com a presença da procuradora Carolina de Almeida Mesquita. A Embraer e a Boeing, notificadas a comparecer no evento, não enviaram representantes. Também participaram da mesa de abertura o dirigente sindical e funcionário da Embraer Herbert Claros, o procurador da República Ângelo Augusto Costa e o defensor público Rodrigo Figueiredo de Oliveira. O MPT convidou os especialistas em mercado da aviação Marcos Barbieri, professor de economia da Unicamp, e Roberto Bernardes, coordenador do programa de pós-graduação em administração do Centro Universitário FEI, para palestrar na audiência.

Para o MPT, a negociação entre a Embraer e a Boeing, se concretizada, pode oferecer significativa diminuição da atividade industrial no país, o que resultaria no desaparecimento definitivo de dezenas de milhares de empregos, perda de arrecadação pelo Estado, transferência de recursos humanos altamente qualificados e de tecnologia avançada ao exterior, e no aprofundamento do processo de desindustrialização e dos elevados índices de desemprego no Brasil.

“Toda essa desinformação que gira em torno do negócio entre as duas empresas começa com a apresentação de uma joint venture, que na teoria significa uma aliança estratégica por um objetivo comercial comum por tempo determinado. Mas o que não foi sequer informado à sociedade é que todo o controle dessa nova empresa que vai explorar a aviação comercial ficará com a Boeing. Estamos falando de 100% da gestão sendo exercida pela norte-americana”, revela o procurador.

Gomes citou o sucesso da Embraer na produção de aviões de até 150 lugares, segmento do qual a Boeing se retirou há décadas por não possuir expertise no desenvolvimento desse tipo de aeronave. Com a venda e o total controle da gestão pela Boeing, a Embraer não teria voz para vetar decisões equivocadas, possibilitando a sua derrocada. “Isso é a transferência onerosa de 80% do capital social e 100% do controle do segmento de aviação comercial, que corresponde a 58% da receita e 90% do lucro da Embraer. É disso que estamos falando”, disse.

O procurador lembrou casos de joint ventures criadas com o fim específico de formar parcerias comerciais em linhas, ou “famílias” de aeronaves com tempo determinado de vida útil, como foi o caso da parceria entre Airbus e Bombardier. A partir desta joint venture, a Bombardier, que corria riscos de quebrar, conseguiu inserir seu produto no mercado norte-americano sem a sobretaxação do governo local, mantendo o desenvolvimento e produção de aeronaves em solo canadense. A Airbus detinha 51% da gestão do negócio. “O governo canadense exigiu e obteve a garantia contratual com sanções. A principal fábrica produtora dos novos aviões deveria continuar no Canadá, e o centro de desenvolvimento de novas tecnologias também, portanto a maior parte dos empregos ficaria no Canadá. Então como é que no Brasil, em condições muito mais benéficas, nós conseguimos um acordo muitas vezes pior? A comparação entre governo brasileiro e governo canadense é de nos causar uma verdadeira vergonha nacional. Como que em condições mais favoráveis o nosso governo não está obtendo um acordo melhor que o do Canadá? Mas na verdade, nós não estamos obtendo um acordo um pouco pior, mas muito pior”.    

Golden share – O MPT notificou a União Federal recomendando que o governo brasileiro exigisse garantias às empresas como contrapartida do negócio, dentre elas, a manutenção da produção e do desenvolvimento de aeronaves no Brasil. Contudo, não houve resposta formal do Ministério da Defesa, o que levou o MPT a ingressar com ação civil pública na justiça do trabalho, pedindo que esta obrigação fosse determinada pelas vias judiciais. O processo aguarda julgamento.

Isso porque o governo brasileiro possui a chamada golden share, que são ações de classe especial da Embraer que dão direito a vetar a negociação com a Boeing, caso ela não atenda ao interesse nacional. “Estamos falando da extinção de mais de 26 mil empregos. Só no caso da Embraer, tirando as cadeias de fornecedores, de R$ 3,3 bilhões por ano de folha de pagamento, estando a maior parte dos empregados em São José dos Campos. Imaginem o impacto para esta cidade com a perda de algo em torno de R$ 3 bilhões de sua economia, que faz gerar inúmeros negócios. Desde a privatização da Embraer foram injetados na empresa, apenas pelo BNDES, de 2001 a 2016, R$ 85,9 bilhões, segundo publicação recente do banco. Foram concedidas isenções fiscais superiores a R$ 2 bilhões para a fabricação de aeronaves, outros bilhões de desoneração de folha. Colocando na ponta do lápis, estamos falando de mais de R$ 100 bilhões que foram investidos na empresa privatizada pelo povo brasileiro. Dinheiro do contribuinte que viabilizou o sucesso dessa empresa, que está sendo agora vendida por uma ínfima parte desse dinheiro. O contribuinte brasileiro colocou mais de R$ 100 bilhões e a Boeing está comprando a parte mais lucrativa por R$ 14,4 bilhões. Então eu lhes pergunto, o contribuinte que investiu todo esse dinheiro na companhia privada, será compensado de que forma por esse investimento?”, questionou o procurador.

Fim da mão de obra – Na audiência pública, a procuradora Ana Farias Hirano fez um alerta: há sério risco de extinção dos postos de trabalho na Embraer caso a negociação com a Boeing seja efetivada. Para entender a situação, ela resgatou o histórico da empresa norte-americana, que sempre manteve sua produção em solo estadunidense. A primeira planta produtiva da Boeing fora dos Estados Unidos fica na China, apenas em razão da imposição do governo chinês quando da celebração de grandes contratos comerciais. Trata-se de uma pequena planta que vai se dedicar apenas às etapas mais simples da produção, interior da aeronave e pintura, o que tende a acontecer também com as plantas fabris brasileiras.

“Outro ponto a considerar para esses riscos é a atual política adotada pelo presidente norte-americano Donald Trump, que prega “compre produtos norte-americanos, contrate norte-americanos”. Com uma cultura extremamente protecionista, o presidente dos EUA tem exigido das empresas norte-americanas a criação de empregos naquele país, impondo barreiras comerciais a produtos importados. Se essa terceira empresa continuar fabricando jatos no Brasil, assim como faz a Embraer hoje, quando esses jatos ingressarem no mercado norte-americano, ainda será um produto importado. Ainda que produzido pela Boeing, fora do território norte-americano, e assim, provavelmente serão taxados. Eles perderiam a “guerra” contra a Airbus, que está produzindo os mesmos jatos em território norte-americano. Certamente, eu não tenho dúvida de que, se a situação fosse inversa, o presidente Trump jamais concordaria com a venda da Boeing à Embraer”, citou a procuradora, que ainda ressaltou que “o Ministério Público do Trabalho não está falando em veto à operação comercial, mas de garantias”.

Herbert Claros, funcionário da Embraer e representante do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, aponta ainda outras questões: “A Embraer vive um dos melhores momentos da sua história, e essas são palavras do próprio presidente da companhia. Isso nos aspectos econômico, comercial e tecnológico, de inovação. Por que o conselho administrativo da empresa quer vende-la, então? Na opinião dos sindicatos, para atender objetivos dos donos da própria Embraer, ou seja, os acionistas. Mais de 70% das ações da empresa negociadas no mercado pertencem a estrangeiros, a maior parte bancos norte-americanos, os maiores interessados na venda”.

Simbiose – Segundo Marcos Barberini, professor de economia da Unicamp e especialista no mercado de aviação, todos os conglomerados aeroespaciais de defesa no mundo são empresas de controle nacional, seja estatal ou privada, uma vez que há “uma simbiose da atuação entre Estado e empresas, através do poder de compra da área militar ou financiando tecnologia, exportação ou investimentos”, por isso a importância do governo brasileiro conferir um olhar mais cauteloso à negociação com a Boeing.

Os dados apresentados mostram a Embraer como 16ª maior conglomerado aeroespacial de defesa, dentre os 20 maiores do ranking mundial, com faturamento na faixa de US$ 5,8 bilhões. “Apesar do valor da Boeing ser muito superior ao valor da Embraer, apesar dos faturamentos serem mais de 10 vezes na área de pesquisa, desenvolvimento e inovação, a Boeing investiu US$ 3 bilhões, e a Embraer US$ 600 milhões. Isso é cinco vezes mais em termos proporcionais, ou seja, a Embraer tem investido muito mais em desenvolvimento tecnológico do que a Boeing, sendo muito mais inovadora no sentido proporcional do que a norte-americana”, afirmou o professor.

Então, por que vender a empresa à Boeing? Barbieri disse que não há motivos para vender a Embraer, uma vez que a empresa é um “sucesso” comercial, e a única brasileira que apresenta inserção ativa no mercado internacional. “Ela passa a ser apenas uma peça dentro do conglomerado Boeing, uma unidade de produção e de fornecimento da norte-americana. Além de eles terem 80%, eles têm total controle operacional desta unidade. Para a Boeing é um excelente negócio. Estão comprando uma empresa que é líder de mercado no seu segmento, com 60% do mercado, 50% das encomendas futuras e entra no mercado comprando uma empresa líder. Mais do que isso, comprando as principais unidades produtivas, como Faria Lima e outras unidades em Portugal, que são as joias da coroa em tecnologia que foi colocada dentro de estrutura produtiva, em automatização, etc”.

Mão de obra especializada e divisão – Para Barbieri, a negociação geraria uma divisão da empresa brasileira entre a área executiva e de defesa de um lado, e comercial de outro, o que seria o contrário da lógica de concorrência, sendo uma lógica de concentração, de fusão, de integração de tecnologia dual. “Na hora que eu faço esse tipo de atuação, tudo se desmonta. Como a área executiva e de defesa vai sobreviver sem a área comercial?”, questionou o palestrante.

O especialista também chamou atenção para as deficiências da área de engenharia da Boeing, que inclusive vem perdendo parte de sua mão de obra na área de desenvolvimento, deixando de inovar no segmento. “A concentração do desenvolvimento tecnológico vai ser mantida no Brasil? Eu não acredito. Uma parcela dos engenheiros pode ser convidada a trabalhar diretamente em Seattle, e alguns outros vão atuar na área da adaptação”, disse, sobre a possível fuga de mão de obra especializada para os EUA.

Por fim, Barbieri mostrou preocupação com a manutenção da cadeia de fornecedores (cerca de 70), que é extremamente dependente da Embraer. Segundo ele, poucos teriam competência para integrar a cadeia da Boeing, o que geraria mais desemprego e ainda menos renda para o país. “Isso representa um risco para a balança comercial, pois o Brasil é um grande exportador. Não há garantias de que isso será mantido. Do ponto de vista da integração tecnológica, a área de defesa não conseguirá sobreviver sem a área comercial. Há um desmonte da Embraer, e a empresa que conhecemos deixa de existir se esse memorando for implementado”, lamenta.

Em seguida, o também professor Roberto Bernardes trouxe à audiência seu conhecimento técnico sobre o setor, inclusive aquele adquirido durante seu trabalho na Embraer. “Este não é um empreendimento em conjunto, feito em cima da linha de produto e segmento, como foi a Autolatina (parceria entre Volkswagen e Ford para oferecer os modelos Apolo e Verona ao mercado nos anos 90), ou como foi com a Fiat e a GM. O que vemos, na verdade, é um take over, uma transferência do controle acionário”, afirmou.

Bernardes citou uma experiência pessoal que teve com o executivo de uma grande empresa nos anos 90, pelo qual teve acesso a um documento assinado pelo secretário de Defesa norte-americano estabelecendo que o nível de status de poder tecnológico permitido para o Brasil estava “excedido”. “O documento do governo norte-americano promovia o desencorajamento dos países emergentes a se moverem com a indústria aeronáutica ou com a indústria da área de defesa. Então o que está em jogo agora é uma questão de soberania do futuro do país. As tecnologias críticas devem ser desenvolvidas por nós, ou ninguém nos dará acesso”, explicou.

“O ecossistema da ciência e tecnologia do futuro não sobrevive de forma intensa sem a Embraer. A discussão vai além dos empregos. Daqui 10 anos, a Embraer não sobreviverá ao mercado global altamente concentrado”, lamentou o professor.

A audiência pública se encerrou após debates com membros da sociedade civil.

  

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